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Unidade na Pluralidade

Estudos

Medida Provisória Estadual



Segundo entendimento do STF, os Estados podem emitir Medida Provisória. Não há na Constituição Federal nem vedação, nem uma autorização expressa. Aceita-se que não seja uma afronta à Separação de Poderes prevista no art. 2º, sendo então, etapa normal do processo legislativo.
O art. 25 da C.F. dá a entender que isso seja possível:

Art. 25. Os Estados organizam-se e regem-se pelas Constituições e leis que adotarem, observados os princípios desta Constituição.

§ 1º - São reservadas aos Estados as competências que não lhes sejam vedadas por esta Constituição.

§ 2º - Cabe aos Estados explorar diretamente, ou mediante concessão, os serviços locais de gás canalizado, na forma da lei, vedada a edição de medida provisória para a sua regulamentação.

Se há vedação na utilização de MPs nessa matéria (serviços locais de gás canalizado), para as outras ela  deve ser permitida.

A possibilidade do chefe do Executivo estadual emitir Medidas Provisórias é prevista nos Estados de Santa Catarina, Acre, Piauí e Tocantins.
Sobre esse assunto, ver a ADI 425.
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Medida Provisória e repristinação tácita


Repristinação é o retorno ao vigor de uma lei que estava revogada (HORCAIO, p. 776).

No ordenamento jurídico brasileiro, a norma que se apresenta no artigo segundo, parágrafo terceiro da Lei de Introdução ao Código Civil é a regra: a lei revogada não se restaura por ter a lei revogadora perdido a vigência. Em outras palavras, não há repristinação tácita, ela deve ser expressa.

Há, porém, uma situação relativamente nova que surge com a medida provisória (MP).
A MP se comporta internamente ao Congresso como um projeto de lei; externamente, como lei. Também pode ser explicada como um projeto de lei com eficácia antecipada.
Quando é editada uma Medida Provisória, as leis conflitantes têm suspensa sua eficácia, que pode ser restaurada caso a MP seja rejeitada pelo Congresso. Contrariamente a esse entendimento, defende-se que os efeitos da MP não se limitam à suspensão de eficácia: o que ocorre é uma verdadeira revogação.
Apesar de não ser considerada lei num sentido estrito, pois não percorreu o processo legislativo previamente à sua vigência, a MP é ato normativo primário com força de lei, revogando a legislação anterior conflitante (sob a condição resolutiva de ser aprovada pelo Congresso a sua conversão em lei).

A não conversão em lei da Medida Provisória que revogou legislação conflitante provoca a “repristinação tácita” dos dispositivos revogados.

O nosso direito não admite, como regra, a repristinação, que é a restauração da lei revogada pelo fato da lei revogadora ter perdido a sua vigência.Não há, portanto, o efeito repristinatório, restaurador, da primeira lei revogada, salvo quando houver pronunciamento expresso do legislador nesse sentido. (GONÇALVES, p. 46).
DECRETO-LEI Nº 4.657, DE 4 DE SETEMBRO DE 1942.
Art. 2o Não se destinando à vigência temporária, a lei terá vigor até que outra a modifique ou revogue.
§ 3o Salvo disposição em contrário, a lei revogada não se restaura por ter a lei revogadora perdido a vigência.
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988
Art. 62. Em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 32, de 2001)

AMARAL JÚNIOR, José Levi Mello do. Medida provisória e a sua conversão em lei. São Paulo: RT, 2004, p. 121 a 300.
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume I: parte geral. 7 ed. São Paulo: Saraiva, 2009.
HORCAIO, Ivan. Dicionário Jurídico Referenciado. São Paulo: Primeira Impressão, 2007.
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Análise da Constituição da República do Chile sob a ótica da separação dos poderes



Em seus artigos iniciais a Constituição chilena afirma a liberdade, a igualdade e a dignidade da pessoa humana; a unicidade do Estado; a Democracia; a Soberania e o respeito aos direitos humanos; a submissão das instituições e funções públicas à Constituição;
Ao caracterizar os poderes, inicia com o Presidente da República, a quem cabem a chefia de Estado e a administração do Governo (sem possibilidade de reeleição) possuindo, dentre outras, estas atribuições: sancionar e promulgar leis; editar decretos com força de lei, sob prévia delegação do Congresso; fiscalizar o comportamento do judiciário, podendo requerer à Corte Suprema e ao Ministério Público que tomem providências.
Para a Câmara dos Deputados, além das atribuições normais, coube a fiscalização dos atos do Governo (do Presidente, dos Ministros e também dos tribunais superiores do Judiciário).
O Senado recebe as denúncias que a Câmara dos Deputados pronunciar; atua como mediador das discussões entre o Governo e os Tribunais Superiores; dá ou não consentimento aos atos do Presidente nos casos em que a Constituição determinar; declara incapacidade do Presidente.
Não podem ser candidatos a deputados: os Ministros de Estado, os juízes de tribunais superiores, entre outros.
As garantias das opiniões dos membros do parlamento são reservadas às opiniões e votos no desempenho de suas atribuições nas sessões e comissões.
O artigo 76 reforça a separação de poderes ao afirmar que nem o Presidente, nem o Congresso podem exercer funções judiciais cíveis ou criminais.
A prisão de certos membros do poder Judiciário somente pode suceder por ordem do tribunal competente ou em flagrante delito.
Criou-se no art. 83 o Ministério Público.
Como guarda da Constituição, criou-se um Tribunal Constitucional.

A Constituição chilena possui os mecanismos clássicos da separação de poderes, tais como: o sistema de freios e contrapesos, em que os poderes, apesar de independentes, fiscalizam-se uns aos outros; as garantias para que possam atuar assim (independentes e fiscalizando-se mutuamente); há as figuras do Ministério Público e do Tribunal Constitucional, ambos independentes.

Os pressupostos para esta análise estão aqui.
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Separação de Poderes



A Separação de Poderes como é conhecida modernamente tem suas origens na obra de Montesquieu: “Do Espírito das Leis”. Nela, o autor propõe, ao analisar a Inglaterra do séc. XVIII, uma separação dos poderes que resulta numa neutralização mútua entre os mesmos. No trecho abaixo, os três poderes somente devem avançar concertadamente, do contrário, permanecerão em repouso.
Eis então a constituição fundamental do governo de que falamos. Sendo o corpo legislativo composto de duas partes, uma prende a outra com sua mútua faculdade de impedir. Ambas estarão presas ao poder executivo, que estará ele mesmo preso ao legislativo.
Estes três poderes deveriam formar um repouso ou uma inação. Mas, como pelo movimento necessário das coisas, eles são obrigados a avançar, serão obrigados a avançar concertadamente. MONTESQUIEU, livro décimo primeiro).
Essa fórmula surge como uma tentativa de limitar o poder do Estado absolutista. Era uma proteção aos cidadãos, à nova classe em ascensão.

Também possui preocupação nesse sentido a Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, que em seu artigo 16º afirma a importância da separação dos poderes para uma verdadeira Constituição, apesar de não garantir em seu texto o direito à vida como direito natural (menciona apenas a liberdade e a igualdade).
Art.1º. Os homens nascem e são livres e iguais em direitos. As distinções sociais só podem fundamentar-se na utilidade comum.
Art. 2º. A finalidade de toda associação política é a conservação dos direitos naturais e imprescritíveis do homem. Esses direitos são a liberdade, a prosperidade, a segurança e a resistência à opressão.
Art. 16.º A sociedade em que não esteja assegurada a garantia dos direitos nem estabelecida a separação dos poderes não tem Constituição.
A formulação de Monstesquieu já antecipava elementos que foram aprimorados pelos autores da Constituição dos Estados Unidos da América. Apesar de utilizarem conceitos expostos em “Do Espírito das Leis”, o modelo de Estado proposto é diferente em vários aspectos, pois a sociedade americana não possuía realeza ou nobreza. Foram teorizados outros mecanismos para manter afastada a “tirania” numa República Representativa: o sistema de freios e contrapesos, que é atribuído a James Madison, um dos três autores de “O Federalista” - os atos gerais e abstratos são de competência do Legislativo (cabendo veto); apesar da atuação do Executivo se dar diretamente na sociedade, é limitada pelas normas anteriormente editadas; cabe ao Judiciário agir como um freio à possíveis abusos dos demais poderes.
Concomitantemente, era necessário criar mecanismos que impedissem uma tirania da maioria que poderia surgir numa democracia direta, ameaçando os direitos de uma facção minoritária. A solução foi a adoção de um sistema representativo para a República.
Para que a separação de poderes funcionasse a contento, os poderes deviam ser iguais e sem hierarquias entre si. Imunidades e garantias são atribuídas aos diferentes agentes de acordo com as suas funções para possibilitar o controle recíproco e soberano.
Essa separação de poderes concebida como uma garantia aos cidadãos retira do Estado agilidade, e por isso mesmo, não foi praticada rigorosamente. Por essa razão, posteriormente foram criados mecanismos como: delegação de competências, transferência constitucional de competências, a criação do Ministério Público para que o Judiciário mantenha-se como um poder inerte e imparcial.

DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do estado. 28ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009.
MONTESQUIEU, Charles de. O Espírito das Leis, Título original: L´Esprit des lois. 1748.
WEFFORT, Francisco C. Os Clássicos da Política, Maquiavel, Hobbes, Locke, Montesquieu, Rousseau, “O Federalista”, 1º volume. 13ª ed. São Paulo: Editora Ática, 2003.
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Durkheim - o suicídio II



Para realizar as comparações entre os diversos meios sociais, Durkheim utiliza um:

“coeficiente de preservação” = A taxa de suicídios de um grupo / taxa de suicídio de outro grupo.

- Suicídio Egoísta

Vínculos do suicídio com a religião:
As taxas de suicídio entre Protestantes era maior do que entre católicos.
O suicídio é igualmente condenado em ambas as religiões em seus dogmas.
A diferença seria o espírito de livre exame. O protestante pode examinar a Bíblia diretamente, individualmente, logo, ele fica mais sozinho, o grupo é menos coeso. O católico necessita de uma integração maior para as práticas.
O meio protestante está em maior sintonia com o mundo moderno, pois os católicos estão submetidos a dogmas que não podem ser analisados pela razão. A religião protestante surge num momento de decadência das crenças tradicionais, dessa forma, os integrantes desse grupo dão mais valor ao conhecimento. Durkheim examina dados como o fato de as crianças de países protestantes estarem mais na escola do que em países católicos.


Vínculo do suicídio com o estado civil
Fazia-se a comparação sem levar em conta a idade dos suicidas, o que era um erro, pois a idade é fator de suicídio. Quanto maior a idade, maior o declínio físico, social, a exclusão, maior a tendência ao suicídio.
Casados com mais de 25 anos se suicidam menos do que os solteiros, exceto com casamentos que acontecem muito cedo, pois os indivíduos de menos de 20 anos tem um coeficiente de preservação menor.
As mulheres possuem coeficiente de preservação menor que os homens nesses casos.
Uma explicação seria o fato de que o casamento é uma seleção, que pode escolher as pessoas mais sadias, sem patologias. Tal explicação não interessa a Durkheim, pois não traz explicações sociológicas. Para ele, é a família que protege os indivíduos pelas interações que proporciona, por exemplo, o suicídio diminui em famílias numerosas. Ao contrário das teorias malthusianas, a família numerosa cria no indivíduo o desejo de viver.
Uma explicação alternativa seria refutada pelos durkheinianos: o suicídio da mulher seria camuflado, pois as causas seriam mais ligadas à família, enquanto os homens teriam causas ligadas ao trabalho, etc.

Vínculos com a sociedade política.
Em épocas de maior agitação, haveria diminuição dessas taxas, pelo maior patriotismo, fins coletivos, o indivíduo pensa mais no coletivo do que em si mesmo.

Um meio social integrado protege os indivíduos.
Ele propõe uma dupla qualidade ao homem: orgânico e social.
O homem enquanto ser puramente orgânico pode viver sem o meio social.
Porém quando possui interesse, os valores desse homem somente serão alcançados com o auxílio do meio social. Por exemplo, se a cultura é importante ao indivíduo, ele necessita de um meio social que valorize essas qualidades.

- Suicídio Altruísta.
O indivíduo se mata em nome de algo maior que ele: Religião ou até para o bem coletivo de sua sociedade.
Algo como o pouco valor à vida que se prega entre os militares, arriscar-se em missões perigosas ou se sacrificar pelos colegas.

- Suicídio Anômico
A sociedade limita os objetivos dos indivíduos, regulando-os para que ele não procure objetivos indefinidos e ilimitados. Do contrário, haveria a possibilidade dos indivíduos entrarem num estado de anomia (quando a sociedade não consegue regular esses objetivos).

Relacionado à economia.
Crise de prosperidade: não se sabe o que se pode ambicionar, tão grande é a prosperidade. Mesmo que somente as classes de maior possibilidade econômica é que se beneficiem diretamente dessa prosperidade, as classes logo abaixo também ambicionam o que veem, levando a sociedade toda a um estado de anomia (falta de limites, de objetivos claros).
Numa sociedade industrial ocorre o que Durkheim chama de anomia crônica, pois os indivíduos são estimulados a ambicionar cada vez mais, são eternamente insatisfeitos (vide os manuais de auto-ajuda).

Na sociedade doméstica, conjugal.
Nos locais em que o divórcio é uma prática disseminada, essa fenômeno interfere na taxa de suicídios dos casados.
O homem se beneficia do casamento, pois quando se casa, encerra-se a fase de maior aventura... Sem o casamento seria o mal infinito (aventuras desmedidas sem prazo para término).
A mulher é naturalmente regrada e o casamento seria uma continuação normal de sua vida.
O homem teria os desejos mais intelectualizados, possuía uma vida mental mais desenvolvida porque sua vida social era mais intensa (estudo e trabalho).
O casamento impõe maiores regras à vida, porém para o homem isso é atenuado em relação à vida afetiva e amorosa. A monogamia é exigida da mulher, mas nem tanto do homem.
Há aumento do suicídio dos casados em lugares que o divórcio é mais permitido. A instituição do casamento nesses lugares está enfraquecida.

DURKHEIM, Emile. Suicídio: Estudo de Sociologia, O. São Paulo: Editora Martins Fontes, 2000.
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Durkheim - o suicídio I



Com o aumento das taxas de suicídio, surgiu a preocupação prática, em termos demográficos, para esse problema social. Havia preocupações com relação à quantidade de pessoas disponíveis para as forças armadas, p. exemplo. O suicídio era considerado como patologia social como o alcoolismo, etc.
Durkheim considerava que o suicídio não era um fenômeno unicamente pessoal, era necessário investigar outros fatores, pois as taxas de suicídio variavam conforme meio social, a religião e demais fatores.
As causas ocasionais (contrariedades amorosas, decepções de vida, os motivos alegados) são comuns às várias pessoas, mas ele acreditava que havia fatores de maior importância: as variáveis sociais.

Tipos de suicídio descritos por Durkheim:
 - Relacionados à Integração:
A sociedade deveria atrair o indivíduo tentando evitar que ele se suicidasse.
O indivíduo pode estar tão isolado que se suicida. O suicídio egoísta. O indivíduo dá maior importância aos seus interesses.
Por outro lado, a sociedade pode estar tão integrada, com excesso de integração que leva o indivíduo a se suicidar (pelo bem da sociedade). O suicídio altruísta.


 - Relacionados à Regulação:
Excesso de regulação - suicídio fatalista. (por exemplo: escravos que nada podem almejar, pois não reconhecem a autoridade que os submete).
Falta de regulação (de indicadores para os objetivos pessoais, p. ex.) – suicídio anômico.

DURKHEIM, Emile. Suicídio: Estudo de Sociologia, O. São Paulo: Editora Martins Fontes, 2000.
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Durkheim - As Regras do Método Sociológico

O método sociológico de Durkheim é influenciado pela época em que foi formulado, com um viés positivista predominante, nomeando de “fatos sociais” os objetos de estudo da sociologia. Deve-se observar os fatos sociais como se fossem coisas, buscando uma posição neutra:

1- Os fatos sociais não são resultados de consciências individuais que se justapõe, mas síntese do pensamento da coletividade. As manifestações individuais que se repetem, portanto, não são fatos sociais;

2- Os fatos sociais são aqueles em que uma coerção externa aos indivíduos os torna obrigados (a agir ou pensar). Tal coerção pode ser moral, educacional (que internaliza a coerção tornando-a um hábito) ou devida ao Direito.

...não há, por assim dizer, acontecimentos humanos que não possam ser chamados sociais.

Mas, na realidade, há em toda sociedade um grupo determinado de fenômenos que se distinguem por caracteres definidos daqueles que as outras ciências da natureza estudam.

Eis aí, portanto, maneiras de agir, de pensar e de sentir que apresentam essa notável propriedade de existirem fora das consciências individuais.
Esses tipos de conduta ou de pensamento não apenas são exteriores ao indivíduo, como também são dotados de uma força imperativa e coercitiva em virtude da qual se impõem a ele, quer ele queira, quer não.

Se tento violar as regras do direito, elas reagem contra mim para impedir meu ato, se estiver em tempo, ou para anulá-lo e restabelecê-lo em sua forma normal, se tiver sido efetuado e for reparável, ou para fazer com que eu o expie, se não puder ser reparado de outro modo. Em se tratando de máximas puramente morais, a consciência pública reprime todo ato que as ofenda através da vigilância que exerce sobre a conduta dos cidadãos e das penas especiais de que dispõe. Em outros casos, a coerção é menos violenta, mas não deixa de existir.

...toda educação consiste num esforço contínuo para impor à criança maneiras de ver, de sentir e de agir às quais ela não teria chegado espontaneamente. Se, com o tempo, essa coerção cessa de ser sentida, é que pouco a pouco ela dá origem a hábitos, a tendências internas que a tornam inútil, mas que só a substituem pelo fato de derivarem dela.

Eis o que são os fenômenos sociais, desembaraçados de todo elemento estranho. Quanto às suas manifestações privadas, elas têm claramente algo de social, já que reproduzem em parte um modelo coletivo; mas cada uma delas depende também, e em larga medida, da constituição orgânico-psíquica do indivíduo, das circunstâncias particulares nas quais ele está situado. Portanto elas não são fenômenos propriamente sociológicos. Pertencem simultaneamente a dois reinos; poderíamos chamá-las sociopsíquicas.

Podemos assim representar-nos, de maneira precisa, o domínio da sociologia. Ele compreende apenas um grupo determinado de fenômenos. Um fato social se reconhece pelo poder de coerção externa que exerce ou é capaz de exercer sobre os indivíduos; e a presença desse poder se reconhece, por sua vez,seja pela existência de alguma sanção determinada, seja pela resistência que o fato opõe a toda tentativa individual de fazer-lhe violência. Contudo, pode-se defini-lo também pela difusão que apresenta no interior do grupo, contanto que, conforme as observações precedentes, tenha-se o cuidado de acrescentar como segunda e essencial característica que ele existe independentemente das formas individuais que assume ao difundir-se.

Nossa definição compreenderá portanto todo o definido se dissermos: É fato social toda maneira de fazer, fixada ou não, suscetível de exercer sobre o indivíduo uma coerção exterior; ou ainda, toda maneira de fazer que é geral na extensão de uma sociedade dada e, ao mesmo tempo, possui uma existência própria, independente de suas manifestações individuais.

DURKHEIM, Emile. Regras do Método Sociológico, As. 3ª edição. São Paulo: Editora Martins Fontes, 2007.

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Herbert Hart V

Problemas na teoria de Hart.
As regras mais importantes do sistema jurídico são as regras secundárias, pois em sociedades desenvolvidas são essas regras que garantem o funcionamento do sistema jurídico, oferecendo critérios de orientação para identificar uma regra jurídica, para alterar essa regra e para determinar se essa regra foi ou não violada. A mais importante de todas as regras secundárias é a Regra de Reconhecimento, que reconhece os critérios de validade das outras regras.
A regra de reconhecimento se assemelha a norma fundamental de Kelsen, pois ambas desempenham a mesma função: são normas supremas que determinam a validade de todas as outra normas do sistema. No entanto, existem diferenças entre a concepção de Norma Fundamental e a idéia de Regra de Reconhecimento, por exemplo, a norma fundamental é uma mera idéia (hipótese teórica) pensada pelos cientistas do direito para dar coerência à concepção do ordenamento jurídico como uma conjunto de normas válidas. Já a regra de reconhecimento, é uma regra positiva, ou seja, posta pelo ser humano, não pressuposta pelos teóricos do direito, sua existência é concreta, a regra de reconhecimento é o fato social utilizado pelos práticos do direito pra conferir unidade ao sistema jurídico dentro da própria prática.

NF
RR
IDÉIA (HIPÓTESE TEÓRICA)
FATO SOCIAL
PENSADA
UTILIZADA
PELOS CIENTISTAS DO DIREITO
PELOS PRÁTICOS DO DIREITO
COERÊNCIA
UNIDADE


Essa diferença entre a Teoria da Norma Fundamental e a Teoria da Regra de Reconhecimento implica em uma nova concepção da racionalidade jurídica, a razão de algum fenômeno ser identificado como direito passa a estar dentro da vida prática, dentro do próprio sistema jurídico em seu processo de aplicação, a razão do direito, ou o fundamento racional dos enunciados jurídicos não é mais externo, ou apenas teórico. A partir de Hart, fala-se na existência de uma racionalidade jurídica prática.
No entanto, a existência de racionalidade jurídica prática não significa que toda a vida prática do direito seja determinada racionalmente, existem situações na pratica de aplicação do direito que escapam do controle racional mesmo em sociedades nas quais a aplicação de regras primarias é organizada por regras secundárias.
Isso ocorre, segundo Hart, devido a um problema insuperável da linguagem jurídica, que é sua indeterminação. A linguagem das regras é a linguagem natural, porém o uso da linguagem natural tem dois problemas:
1- Os símbolos lingüísticos não dão conta da infinidade de características dos objetos do mundo.
2- Para abranger o maior número de objetos é possível empregar palavras abstratas e genéricas, mas isso causa vagueza e ambigüidade dos significados aumentando a indeterminação que se pretendia controlar.
A determinação dessa vagueza e ambigüidade ocorre no campo do direito por meio da interpretação jurídica, logo, se todas as regras jurídicas se manifestam por meio da linguagem natural, todas as regras jurídicas precisam ser interpretadas, porém, não há nenhuma regra capaz de controlar essa interpretação, isso significa que, dentro da vida prática, a determinação do direito pode ser feita por aqueles que interpretam as regras em ultima instância, ou seja, os juízes (que possuem forte poder discricionário para interpretar as regras).
Para Hart , na decisão do direito, o preenchimento da zona de penumbra das regras (teoria da textura aberta) fica à livre escolha dos intérpretes, e o único limite pra interpretação seria o bom senso (que para os juízes significa: imparcialidade, preocupação com os interesses dos envolvidos no caso, etc.).
Das Aulas do Professor Carlos Eduardo Batalha.

MUÑOZ, Alberto Alonso. Transformações na teoria geral do direito – Argumentação e interpretação do jusnaturalismo ao pós-positivismo. São Paulo: Quartier Latin, 2008.
HART, H. L. A. O conceito de direito. Trad. de Antônio de O. Sette-Câmara. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2009.
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Sociologia

Giddens acredita que a sociologia é vista de dois modos diferentes: como uma espécie de estímulo a revoluções, ou como uma ciência natural descritiva (tese com a qual não coaduna e que foi defendida por Durkheim). Para ele a sociologia estuda principalmente as instituições das sociedades avançadas (pós revolução industrial e criação dos Estados Nações) e as transformações dessas instituições.

Nas atividades humanas há o duplo envolvimento dos indivíduos, que criam a sociedade e são por ela criados. O objeto de estudo não permanece inerte ao próprio estudo, portanto, os sistemas sociais não podem ser comparados com a estrutura de sustentação de um edifício (estática demais), mas sim, com um edifício em constante remodelação pelos seus próprios componentes (estruturas e tijolos).

Um dos problemas das teorias que acreditam que há uma evolução social, sendo que a industrialização ocidental e sua produtividade material seria o ápice desse processo, está em seu etnocentrismo, que adota um ponto de vista a partir de sua própria cultura como padrão de medida para avaliar todas as outras, afinal, poder econômico e militar são reflexos de dominação e não de ápice evolutivo. Essa crença dificulta a obtenção de um sentido histórico mais aprofundado sobre essas transformações.

A sociologia estuda uma coletividade que não é tão determinada por leis naturais pretendendo obter alternativas futuras através da análise crítica das sociedades existentes e de suas inter-relações.

GIDDENS, Anthony. Sociologia: Questões e problemas. In: Sociologia: uma breve porém crítica introdução. Rio de Janeiro: Zahar, 1984. Cap. 1.
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Herbert Hart IV

Tratar o direito positivo como um fato social é um grande equívoco, porque a linguagem jurídica ordinária, cotidiana possui uma terminologia que não consegue ser esclarecida de um modo objetivo apenas com fatos. Termos jurídicos como obrigação não conseguem ser apresentados de um modo objetivo apenas como fatos sociais, por existir uma diferença entre ter uma obrigação e estar de fato obrigado a fazer algo. Uma obrigação só aparece em termos objetivos quando corresponde a uma regra.

1- O direito para Hart é um conjunto de regras.

2- Para compreender essas regras é preciso estudar o direito de um ponto de vista interno (dos participantes do sistema jurídico). Pois somente o participante percebe o aspecto fundamental das regras, que é seu aspecto vinculante, o participante não confunde uma mera regularidade com uma regra vinculante. Por isso quem pretende estudar o direito deve observá-lo de dentro.

3- Considerando uma regra do ponto de vista interno se modifica a própria noção de regra jurídica. Na perspectiva interna dos práticos do direito, regras não são simples comando ou enunciados de dever ser, na prática as regras são mais complexas (na pratica jurídica). Em vista disso a melhor definição de regra nesse sentido é padrão aceito como critério de orientação. O direito positivo, portanto, pode ser entendido como um conjunto de critérios de orientação. O direito não é basicamente um fenômeno repressivo, sua função social não é oprimir os indivíduos, e sim oferecer orientação. Esses critérios de orientação em sociedades simples, com baixa diversidade de condutas e grande homogeneidade de pessoas, esses critérios se limitam a colocar restrições a violência e aos comportamentos abusivos. No entanto em sociedades complexas as regras jurídicas não conseguem se limitar apenas a essa função de restringir o uso livre da violência, elas enfrentam problemas complexos, pois não existem problemas apenas na vida social, também existem problemas no próprio conjunto das regras.


As regras diante da complexidade social enfrentam três problemas graves. Elas correm o risco de se tornarem estáticas (não acompanhar a dinâmica da sociedade) ineficazes (não ser aplicadas devido à baixa pressão social) e incertas (as regras até podem se tornarem incertas quanto a sua existência e caráter vinculante).

Devido a essa situação, segundo Hart, nas sociedades complexas não existem apenas critérios de orientação dirigidos diretamente para a vida social, existem Também critérios de orientação que o sistema jurídico coloca para si próprio, ou seja, regras para regular as regras que regulam a vida social. Hart chama essas regras de regras secundárias. Em sociedades complexas as regras secundarias são essenciais, pois são elas que garantem o funcionamento do sistema jurídico, estabelecendo critérios de orientação para a alteração (estática), a aplicação (ineficácia) e o reconhecimento de uma regra vinculante como parte do sistema jurídico (incerteza). Por isso, na visão de Hart, o melhor conceito de direito para as sociedades desenvolvidas não é o conceito de Austin, nem o conceito dos Realistas ou o conceito de Kelsen.

Qual é a concepção de direito que aparece dentro da teoria de Hart?

O conceito de direito nas sociedades complexas é a união de regras primárias e secundárias.

Classificação das regras

Classificação das regras secundárias:

Regras de reconhecimento – contra a incerteza – Constituição art. 60.

Regras de mudança – contra a estática – LICC art. 2º.

Regras de adjudicação – contra a ineficácia – Normas Processuais.

Das aulas do professor Carlos Eduardo Batalha.

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Estados Fracassados

Francis Fukuyama tornou-se conhecido logo depois da queda do muro de Berlin. Seu livro, que pregava o fim da história tendo a democracia liberal como ápice resolutiva das contradições mundiais relevantes, foi um marco do neoconservadorismo americano.

Em 2004 publicou um livro chamado “Construção de Estados”, analisando dados da década de 90. Iniciou avaliando os resultados da política econômica criada pelo “Consenso de Washington” que apontavam para o chamado Estado mínimo: “Hoje é possível ver que não havia nada de errado no consenso de Washington em si: embora os Estados precisassem ser reduzidos em determinadas áreas, ao mesmo tempo precisavam ser fortalecidos em outras”. Essa frase de Fukuyama, ou é muito ambígua, ou traz à tona informações que deviam estar muito bem guardadas (houve uma grande onda de privatizações para atender às exigências de entidades como o FMI, que pareciam não exigir fortalecimento do Estado em nenhuma área).

Com dados sobre função do Estado (sendo promover defesa, lei e ordem como mais importantes e redistribuição de riqueza como menos importantes), cruzados com dados sobre a força de suas instituições (a capacidade de atender as funções elencadas), criou gráficos para qualificar países, coeteris paribus.
Para os economistas, os EUA seriam o ideal: instituições fortes, atendimento das funções consideradas essenciais; países desenvolvidos europeus: instituições fortes, atendimento de maior gama de funções; Brasil: instituições fracas, excessiva carga sobre o Estado; e os piores (África Subsaariana): instituições fracas e pouca efetividade no atendimento das funções.


Seus dados foram obtidos após a crise econômica que atingiu vários países no final da década de 90, ou seja, após eles terem seguido por varios anos as recomendações definidas pelo consenso de Washington: essa aplicação desvairada do conceito de Estado mínimo não solucionou os problemas econômicos desses países.

Fukuyama percebe o problema: a falta de instituições fortes para manter o desenvolvimento econômico. Ele divide os Estados em vencedores e fracassados (mais americano, impossível). Os Estados vencedores possuem o Estado com força suficiente para atender as funções mais importantes; os Estados fracassados, por seu lado, não possuem instituições minimamente funcionais.

Parece até que Fukuyama descobriu a roda. Se ele estivesse na década de 20 nos Estados Unidos, ele seria um liberal convicto, que após a crise de 29 se filiaria à corrente Keynesiana intervencionista.

Será que ele finalmente entendeu a função do Estado Capitalista Liberal descrita por Marx?
Para Marx, o Estado Liberal existia principalmente para manter o Capitalismo, ou seja, liberar o mercado em épocas de economia estável e controlar as crises de superprodução, injetando dinheiro, socializando os prejuízos e controlando os danos gerados pela busca do enriquecimento à todo custo (ou da acumulação ilimitada de capital).

Não há nada de ilógico ou surpreendente no fato do Estado Liberal resguardar a manutenção do sistema econômico. Fukuyama, porém, não poderia aderir a esse conceito, afinal, uma sociedade capitalista, que não aceita socializar a saúde, iria aceitar (tão abertamente) socializar as perdas de empresas como a GM ou de instituições bancárias? (No momento certo, com a ameça de um colapso sombrio, aceitaram que o governo interviesse financeiramente, sem, no entanto, assumir a ciclicidade da situação e o papel estrutural do Estado).

Seu texto nada mais é do que um manual explicativo do funcionamento do Estado Liberal. Uma espécie de memorial descritivo acrítico. Os Estados vencedores apenas o são devido à força de suas instituições; os fracassados, pela falta dessa força. Ele escamoteia as relações entre os Estados num mundo globalizado: não explica as interações entre os Estados vencedores e os Estados fracassados, como se isso não influenciasse na vitória esmagadora dos vencedores sobre os fracassados (LOSERS) .

FUKUYAMA, Francis. Construção de Estados: Governo e Organização no Século XXI. Rio de Janeiro: Editora Rocco, 2005. cap. 1.

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Herbert Hart III

Para Hart o direito é um conjunto de regras. E não um fato social bruto.
Para observar esse conjunto de regras porém, é preciso ter um ponto de vista peculiar, muito distinto dos pontos de vista apresentados pelas outras teorias do direito.
O jurista não pode assumir o ponto de vista político defendido por Austin, ele também não pode assumir o ponto de vista sócio psicológico defendido pelos realistas, o jurista também tem que deixar de lado o ponto de vista científico defendido por Kelsen, ate mesmo porque esse ponto de vista traz uma contradição, que é a fundamentação de suas teorias de acordo com um “ponto de vista neutro”, estudando apenas a estrutura normativa.
Segundo Hart, as teorias do direito até a metade do século XX pensavam que o melhor ponto de vista para conhecer o direito era o ponto de vista externo, Austin os realistas e Kelsen acreditavam que o direito podia ser conhecido de um modo objetivo com um olhar externo. O ponto de vista externo não serve para entender o direito, pois se o direito é um conjunto de regras, a melhor forma de adquirir conhecimento jurídico, é assumir o ponto de vista interno ao conhecimento jurídico, ou seja, o ponto de vista dos práticos do direito, advogados juízes promotores, funcionários, conhecem o direito melhor do que quem está de fora.
O conhecimento jurídico não esta em teorias afastadas da prática, ele é resultado da própria atividade prática.
Dentro do sistema jurídico (no ponto de vista interno), o jurista não apenas considerará que certas situações são regras e não meras regularidades, hábitos, como também o jurista terá uma nova visão das próprias regras. Elas não serão mais comandos, ordens baseadas em coerção porque dentro da prática os enunciados não tem apenas a forma imperativa, é possível encontrar enunciados que não estabeleçam obrigações e proibições, pois existem enunciados jurídicos que são meras definições, meras atribuições de poder, atribuições de competência.
Quem observa o direito de um ponto de vista interno percebe que a melhor definição de regra é como um padrão geral de comportamento que funciona como critério de orientação. Quem olha o direito de um ponto de vista interno percebe que o papel social do direito não é a repressão, no interior da sociedade a função do direito é oferecer orientação.
Alem disso, compreendendo o direito de um ponto de vista interno, é possível perceber que as regras variam de sociedade para sociedade, os sistemas de regras não são sempre iguais. Em sociedades muito simples, nas quais o vínculo entre as pessoas é maior devido à proximidade e ao pequeno número de pessoas, a pressão social já estabelece alguma espécie de controle, alguma organização social. Neste contexto bastam poucas regras porque a maioria das pessoas, daquela comunidade aceita os padrões de orientação, as poucas regras necessárias existem apenas para restringir a violência e os abusos de comportamento.
Já as sociedades complexas enfrentam uma situação diferente, nelas o vinculo entre as pessoas é difuso devido à grande quantidade de sujeitos diferentes que participam da vida social. É difícil existir uma pressão social forte, sendo assim, a ordem social precisa de muitas regras, e essas regras precisam enfrentar novas situações que não existem nas sociedades mais simples.
Entre essas novas situações, três problemas se destacam:
Estática das regras. Ineficácia das regras. Incerteza quanto às regras.
(A resposta para esses problemas pode ser dada pela existência de regras secundárias.)
Por isso, devido a esses três problemas, nas sociedades complexas não é possível existir apenas um nível de regras destinado a organizar diretamente a sociedade, é preciso também que exista um segundo nível de regras pra organizar as próprias regras, que Hart chama de regras secundárias enquanto as regras que regulam a sociedade são chamadas de regras primarias.
Em uma sociedade complexa o direito é um conjunto de regras primárias e secundárias.

Das aulas do professor Carlos Eduardo Batalha.
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Gênios, cretinos, imbecis, estúpidos e loucos.

Umberto Eco traz em seu famoso livro “O Pêndulo de Foucault” um trecho que é muito útil aos que se propõe a fazer uma monografia. Numa conversa com um estudante, o editor classifica as pessoas que lhe apresentam textos: os gênios, os cretinos, os imbecis, os estúpidos e os loucos.

- Sobre o gênio, relacionando-o com a produção de uma tese, é o tipo ideal.
“O gênio é aquele que faz uma componente atuar de maneira vertiginosa, alimentando-a com as outras.”

- Espera-se que o cretino não chegue a produzir uma monografia jurídica.
“O cretino não fala sequer, baba, é espasmódico. Atocha o sorvete na testa, por falta de coordenação. Entra na porta giratória pelo lado contrário. Ele consegue. Por isso é cretino. Não nos interessa, a gente e reconhece de estalo, e não é do tipo que aparece na editora.”

- O imbecil não tem foco em sua redação. Fala de coisas que não tem pertinência com o seu tema. Precisa de muita ajuda para delimitar uma monografia e se manter dentro desses limites.
"Sem imbecil é mais complexo. É um comportamento social. O imbecil é aquele que fala sempre fora do copo. O imbecil quer falar daquilo que está no copo, mas vai e volta, acaba falando do que está fora.
O imbecil não diz que o gato ladra, fala do gato quando os demais falam do cão.”


- Como identificar os estúpidos, se eles são tão bons em chegar a conclusões baseadas em dados que não a sustentam? Falta a concatenação lógica entre as premissas e a tese.
"O estúpido não se engana de comportamento. Engana-se no raciocínio. É aquele que diz que todos os cães são animais domésticos e que todos os cães latem, mas que também os gatos são animais domésticos e que portanto latem.
O estúpido pode mesmo dizer uma coisa certa, mas por motivos errados.
O estúpido é insidiosíssimo. O imbecil a gente reconhece de súbito (para não falar do cretino), enquanto o estúpido raciocina quase como tu, salvo um desvio infinitesimal. E um mestre dos paralogismos.
Disse-lhe que é difícil individualizar o estúpido. Um estúpido pode até ganhar o prêmio Nobel.”

- O louco, por sua vez, procura as explicações para provar a sua tese. Descarta informações que o contradigam e subverte pensamentos para encaixá-los em suas idealizações. Dificilmente produzirá algo de útil.
“O louco é reconhecível de cara. Um estúpido que não conhece os truques. O estúpido procura demonstrar sua tese, tem uma lógica cambeta, mas tem. O louco ao contrário não se preocupa em ter uma lógica, procede por curtos-circuitos. Tudo para ele demonstra tudo. O louco tem uma idéia fixa, e tudo o que encontra lhe serve para confirmá-la.”

Das aulas do professor José Reinaldo de Lima Lopes.
"E o amigo o que faz?" me havia perguntado, agora o sei, com simpatia.
"Na vida ou no teatro?" disse, acenando para o palco do Pílades.
"Na vida."
"Estudo."
"Freqüenta a universidade ou estuda?"
"Não lhe parecerá verdade, mas as duas coisas não se contradizem. Estou terminando uma tese sobre os Templários."
"Que coisa horrível", disse. "Isso não é coisa de doidos?"
"Estou estudando os autênticos. Os documentos do processo. Mas que sabe sobre eles?"
"Trabalho numa editora e numa editora aparecem sábios e loucos. É função do redator reconhecem os loucos num golpe de vista. Quando alguém aparece com essa dos Templários é quase sempre um louco."
"Não me diga. Seu nome é legião. Mas nem todos os loucos falarão dos Templários. E os outros, como é que os conhece?"
"Tarimba. Já lhe explico, ao amigo que é jovem. A propósito, como é seu nome?"
"Casaubon."
"Não era um personagem da Middlemarch?"
"Não sei. Em todo caso era também um filólogo da Renascença, se não me engano. Mas não somos parentes."
"Fica para a próxima. O amigo toma outra? Pílades, mais duas aqui, por favor. Pois vejamos. No mundo existem os cretinos, os imbecis, os estúpidos e os loucos."
"Sobra alguém?"
"Sim, nós dois, por exemplo. Ou pelo menos, sem querer ofender, eu. Mas em suma, todos, a bem dizer, participam de uma destas categorias. Cada um de nós vez por outra é cretino, imbecil, estúpido ou maluco. Digamos que a pessoa normal é aquela que mistura em proporções racionais todos esses componentes, estes tipos ideais."
"Idealtypen."
"Muito bem. Também sabe alemão?"
"Arranho, dá para as bibliografias."
"No meu tempo quem sabia alemão não precisava diploma. Passava a vida sabendo alemão. Creio que hoje isso acontece com o chinês".
"Como não sei alemão bastante, me formo. Mas, voltando à sua tipologia, que é o gênio, Einstein, digamos?"
"O gênio é aquele que faz uma componente atuar de maneira vertiginosa, alimentando-a com as outras." Bebe. Diz: "Boa noite beleza. Já tentou o suicídio?"
"Não", responde a passante, "agora estou numa comunidade."
"Ótimo", lhe diz Belbo. Retornando a mim: "Pode-se praticar até mesmo suicídio coletivo, não acha?"
"Mas e os loucos?"
"Espero que não tenha tomado a minha teoria muito ao pé da letra. Não estou pondo o universo no lugar. Estou dizendo o que é um louco para uma casa editora. A teoria é ad hoc, está bem?"
"Está. Agora é a minha vez."
"Concordo Pílades, por favor, menos gelo. Se não entra logo no circuito. Então. O cretino não fala sequer, baba, é espástico. Atocha o sorvete na testa, por falta de coordenação. Entra na porta giratória pelo lado contrário."
"Como consegue?"
"Ele consegue. Por isso é cretino. Não nos interessa, a gente e reconhece de estalo, e não é do tipo que aparece na editora. Deixemo-lo à parte."
"Pois deixemos."
"Sem imbecil é mais complexo. É um comportamento social. O imbecil é aquele que fala sempre fora do copo."
"Em que sentido?"
"Assim." Ergueu o indicador, apontando-o em direção ao copo, mas veio batê-lo fora, contra o balcão. "O imbecil quer falam daquilo que está no copo, mas vai e volta, acaba falando do que está fora. Se preferir, em termos vulgares, é o mesmo que a gafe do sujeito que pergunta como está sua senhora ao indivíduo que acaba de ser abandonado pela mulher. Dei-lhe a idéia?"
"Deu-me. Conheço muitos."
"O imbecil é muito solicitado, em especial nos eventos mundanos. Põe todos embaraçados, mas depois oferece ocasião de comentário. Em sua forma positiva, torna-se diplomata. Faia fora do copo quando outros cometem a gafe, sabe como desviar o assunto. Mas não nos interessa, não é nada criativo, trabalha de repórter, logo não vem oferecer manuscritos às casas editoras. O imbecil não diz que o gato ladra, fala do gato quando os demais falam do cão. Confunde as regras da conversação e quando o faz bem é sublime. Creio que se trata de uma raça em via de extinção, um portador de virtudes eminentemente burguesas. Vidrado em salão Verdurin, até mesmo em casa Guermantes. Os estudantes ainda lêem essas coisas?"
"Eu leio."
"O imbecil é Joachim Murat, que passa em revista seus oficiais e vê, cheio de condecorações, um da Martinica. "Vous êtes nêgre?", pergunta-lhe. E este: "Oui mon général!" E Murat: "Bravo, bravo, continuez!" E assim por diante. Está me seguindo?
Desculpe, mas esta noite estou comemorando uma decisão histórica da minha vida. Deixei de beber. Quer mais outro? Não responda, me faz sentir culpado. Pílades!"
"E o estúpido?"
"Ah. O estúpido não se engana de comportamento. Engana-se no raciocínio. É aquele que diz que todos os cães são animais domésticos e que todos os cães latem, mas que também os gatos são animais domésticos e que, portanto latem. Ou antes, que todos os atenienses são mortais, todos os habitantes do Pireu são mortais, logo todos os habitantes do Pireu são atenienses."
"O que é verdade."
"Sim, mas por acaso. O estúpido pode mesmo dizer uma coisa certa, mas por motivos errados."
"Pode-se dizer coisas erradas, basta que as razões sejam justas."
"Por Deus. Para que então esforçar-se tanto para se ser animais racionais?"
"Todos os grandes símios antropomorfos descendem de formas de vida inferiores, os homens descendem de formas de vida inferiores, logo todos os homens são grandes símios antropomorfos."
"Essa é bem boa. Já estamos naquele limiar em que a gente suspeita de que algo não se encaixa, mas que nos requer certo trabalho para demonstrarmos o que é e por quê. O estúpido é insidiosíssimo. O imbecil a gente reconhece de súbito (para não falar do cretino), enquanto o estúpido raciocina quase como tu, salvo um desvio infinitesimal. E um mestre dos paralogismos. Não há salvação para o redator editorial, tem que desperdiçar uma eternidade.
Publicam-se muitos livros de estúpidos porque à primeira vista nos convencem. O redator editorial não é obrigado a reconhecer o estúpido. Se a academia de ciências não o faz, por que deveria fazê-lo o editor?"
"A filosofia não o faz. O argumento ontológico de santo Anselmo é estúpido. Deus deve existir porque posso pensá-lo como um ser que encerra todas as perfeições, inclusive a existência. Confunde existência na mente com a existência no real."
"Sim, mas também é estúpida a refutação de Gaunilone. Posso pensar numa ilha no mar mesmo se tal ilha não existe. Confundo o pensamento do contingente com o pensamento do necessário."
"Uma luta entre estúpidos."
"Certo, e Deus se diverte como um louco. Quis a si mesmo impensável só para demonstrar que Anselmo e Gaunilone eram estúpidos. Que escopo sublime para a criação, que digo, para o próprio ato em virtude do qual Deus se quer. Finalizando tudo na denúncia da estupidez cósmica."
"Estamos cercados de estúpidos."
"Não se escapa. Todos são estúpidos, exceto o amigo e eu. De novo, sem querer ofender, exceto o amigo."
"Mas sabe que se aplica a prova de Gódel?"
"Não sei, sou cretino. Pílades!"
"A vez é minha."
"Depois dividimos. Epimênides de Cnosso diz que todos os cretenses são mentirosos. Se ele, que é cretense, assim o diz, e os conhece bem, então é verdade."
"Isto é estúpido."
"São Paulo. Epístola a Tito. Ora esta: todos aqueles que pensam que Epimênides seja mentiroso não podem senão confiar nos cretenses. mas os cretenses não confiam nos cretenses, portanto nenhum cretense pensa que Epimênides seja mentiroso."
"Isto é estúpido ou não?"
"Veja. Disse-lhe que é difícil individualizar o estúpido. Um estúpido pode até ganhar o prêmio Nobel."
"Deixe-me pensar... Alguns daqueles que não crêem que Deus haja criado o mundo em sete dias não são fundamentalistas, mas alguns fundamentalistas pensam que Deus haja criado o mundo em sete dias, portanto ninguém que não creia que Deus haja criado o mundo em sete dias é fundamentalista. É estúpido ou não?"
"Meu Deus - é o caso de dizer... Não saberia. O que me diz?"
"É em todos os casos, mesmo se fosse verdade. Viola uma das leis do silogismo. Não se pode extrair conclusões universais de duas articularidades."
"E se o estúpido fosse o senhor?"
"Estaria em boa e secular companhia."
"Isto mesmo. a estupidez nos rodeia. E talvez por um sistema lógico diverso do nosso. A nossa estupidez é a sabedoria deles. Toda a história da lógica consiste em definir uma noção aceitável de estupidez. Grande demais. Todo grande pensador é o estúpido de outro."
"O pensamento como forma coerente da estupidez."
"Não. A estupidez do pensamento é a incoerência de outro pensamento."
"Profundo. Já são duas horas, daqui a pouco Pílades fecha e não teremos chegado aos loucos."
"Já chegamos. O louco é reconhecível de cara. Um estúpido que não conhece os truques. O estúpido procura demonstrar sua tese, tem uma lógica cambeta, mas tem. O louco ao contrário não se preocupa em ter uma lógica, procede por curtos-circuitos. Tudo para ele demonstra tudo. O louco tem uma idéia fixa, e tudo o que encontra lhe serve para confirmá-la. Reconhece-se o louco pela liberdade com que toma nos confrontos os deveres de prova, na disposição de encontrar iluminações. E lhe parecerá estranho, mas o louco mais cedo ou mais tarde acaba vindo com essa dos Templários.”
"Sempre?"
"Há também loucos sem Templários, mas os de Templários são mais insidiosos. No princípio não o reconhece. parece que falam de modo normal, depois, de súbito..." Fez um sinal de pedir outro uísque, mas voltou atrás e pediu a conta. "Mas a propósito dos Templários. Um dia desses um indivíduo me deixou um original datilografado sobre o assunto. Estou quase apostando que seja um louco, mas de aspecto humano. O original começa de maneira pacata. Quer dar-lhe uma olhada?"
"Com muito prazer. Pode ser até que nele encontre alguma coisa que me sirva."
"Não creio muito. Mas se tem uma horinha livre dê um pulo na editora. Via Sincero Renato número 1. Será de mais proveito para mim do que para o amigo. Poderá me dizer desde logo se lhe parece um trabalho fidedigno."
"Por que confiar em mim?"
"Quem lhe disse que confio? Mas se vier confio. Confio na curiosidade."
Entrou um estudante, de fisionomia alterada: "Companheiros, os fascistas estão ao longo do canal, com correntes!"
"Vou esmagá-los", disse o de bigodes à tártara que me havia ameaçado a propósito de Lenin. "Vamos companheiros!" Saíram todos.
"Que fazemos? Vamos embora?" perguntei, culpabilizado.
"Não", disse Belbo. "São falsos alarmas que Pílades manda espalhar para desobstruir o local. Por ser a primeira noite que deixo de beber, sinto-me alterado. Deve ser a crise de abstinência. Tudo o que lhe disse, até este instante inclusive, é falso. Boa noite, Casaubon."
ECO, Umberto. O Pêndulo de Foucault. Tradução de Ivo Barroso. 2ª ed. São Paulo: Editora Record, 1989.
Título original italiano IL PENDOLO DI FOUCAULT.
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Herbert Hart II

Para tentar conhecer o direito sem recair nos problemas das outras teorias Hart estudou um tema que ainda não tinha sido devidamente considerado pelos outros filósofos do direito:
1) A linguagem ordinária das pessoas em sua vida cotidiana.
Dentro dessa linguagem as pessoas fazem uso de termos jurídicos, as pessoas falam em proibições, em obrigações permissões leis etc. é preciso portanto compreender como as pessoas usam esse termos para saber como um determinado fenômeno pode ter significado jurídico.
A filosofia de Hart é uma Filosofia da Linguagem Jurídica – o conhecimento do direito é uma questão de linguagem e tem a ver com o modo pelo qual os termos jurídicos são usados. Pelo estudo da linguagem ordinária Hart já identifica um sério problema dos realistas, eles não sabem separar duas situações distintas:
2) Problema dos realistas: não saber a diferença entre ter uma obrigação e ser obrigado.
Para um realista esses dois enunciados são idênticos porque uma obrigação somente existirá na visão realista quando corresponder a uma situação de fato. Na linguagem ordinária, porém as pessoas diferenciam esses enunciados, elas falam como se ter uma obrigação jurídica não tivesse a ver com sentimentos subjetivos a frase ter obrigação parece apontar para algo objetivo. É possível ter uma obrigação sem sentir-se forçado, constrangido, coagido a fazer algo (voto, serviço militar). É possível se sentir obrigado sem ter qualquer obrigação (cabide de emprego). Os realistas não enxergam essa diferença, eles fazem uma confusão com o conceito jurídico de obrigação, eles misturam o subjetivo com o objetivo, por isso segundo Hart a Teoria Realista do direito não pode ser considerada uma boa forma de conhecer o direito de verdade. De acordo com Hart o motivo da confusão Realista é simples, eles se apresentam como céticos perante as regras, ou seja, eles negam a existência das regras defendendo que só existem fatos, é por isso que eles não sabem o que é objetivamente uma obrigação jurídica, pois uma obrigação só existe objetivamente por referência a uma regra. Só é possível explicar uma relação jurídica por referência a uma regra, sem a noção de regra explicação é subjetiva. Portanto o direito é constituído por regras. O ceticismo dos realistas perante as regras é causado segundo Hart pela posição que os realistas assumem ao explicar a vida social, os realistas se colocam em uma posição externa perante os fenômenos sociais, como se não existisse nenhuma outra perspectiva para explicar a vida em sociedade, e isso é outro equívoco.
Hart demonstra que todas as praticas sociais podem ser compreendidas de duas formas: por um lado uma pratica social pode ser considerada de um ponto de vista externo, por outro lado, a mesma pratica social também pode ser considerada de um ponto de vista interno.
O ponto de vista externo é a perspectiva do mero observador que considera o fenômeno sem se envolver com ele, o ponto de vista interno é o contrário ele corresponde a perspectiva do participante que está envolvido na prática social, os realistas somente consideram o direito de um ponto de vista externo, esquecendo que o mesmo fenômeno também pode ser visto de um outro jeito, se considerado o aspecto interno do sistema jurídico, ou seja, o ponto de vista das pessoas que aplicam o direito na prática (os práticos do direito). Os realistas lembram a sociólogos, pois eles se recusam a entrar no mundo do direito. Pra conhecer o direito como um conjunto de regras é preciso considerar o direito olhando de dentro do sistema jurídico, ou seja, assumindo o ponto de vista dos práticos do direito, esse é o melhor ponto de vista para conhecer o direito de verdade.
Para a filosofia de Hart o conhecimento jurídico corresponde ao estudo da linguagem jurídica do ponto de vista dos práticos do direito.
Das Aulas do professor Carlos Eduardo Batalha.
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Herbert Hart I

A Filosofia Jurídica de Herbert Hart
1) A posição de Hart perante as filosofias anteriores – crítica:
À teoria jusnaturalista (metafísica)
À Teoria Realista do Direito (ceticismo)
Às teorias Analíticas do Direito (a idéia de obrigação)
2) A proposta de Hart para o conhecimento jurídico:
Analise dos “usos ordinários” da linguagem jurídica
Consideração do “Ponto de Vista Interno”
3) O resultado da proposta de Hart:
Nova visão do direito positivo = união de regras primárias e secundárias.
Na década de 50 do séc. XX o jurista inglês Herbert Hart começou a desenvolver um conjunto de críticas às teorias jurídicas que predominavam naquela época, ele criticou por exemplo, os jusnaturalistas que voltaram a defender o direito natural após a Segunda Guerra Mundial, Pra Hart o direito natural é metafísica, e não serve portanto para conhecer o direito existente dentro da sociedade. Essa crítica se assemelha as críticas já feitas anteriormente pelos realistas e pelos analíticos, porém, a teoria de Hart também não aceitou esses pontos de vista. Hart criticou os realistas dizendo que eles não sabiam a diferença entre regras e hábitos, criticou os analíticos dizendo que eles associam a idéia de obrigação jurídica com comandos e deveres esquecendo que existem regras que apenas trazem permissões e definições.
Hart – a filosofia jurídica proposta por Hart pretende oferecer um “novo começo” para o debate sobre o direito positivo, esse debate, no período posterior à segunda guerra mundial encontrava-se em num impasse: por um lado os juristas realistas defendiam que o conhecimento jurídico era uma questão de fato, por outro lado a teoria de Kelsen defendia que o conhecimento jurídico era uma questão de validade, contra o movimento realista e o pensamento de Kelsen ainda existiam os jusnaturalistas que buscavam o verdadeiro direito na natureza.
Ao passo que os realistas acabam caindo na sociologia, o normativismo de Kelsen acaba caindo no idealismo por conta da Norma Fundamental.
Com as atrocidades dos estados totalitaristas, ressurgem os defensores do direito natural.
A tentativa de sair desse impasse foi tentada por Miguel Reale, pretendendo juntar todas as teorias de uma maneira dialética dizendo tudo se implica, tanto fato(positivismo realistas), como valor(naturalistas) e norma(positivismo kelseniano). Trata-se da teoria tridimensional. Reale não entende a concepção de direito de Kelsen, ao achar que ele fala de norma, enquanto na verdade, direito para kelsen é uma questão de validade, (ou seja, tem "valor" dentro de um ordenamento). As correntes Internacionais filosóficas do direito acabam por aproximar a teoria de Reale às teorias naturalistas, tendo por base o argumento de Reale de que o Homem é a fonte de todo Direito.
Das aulas do professor Carlos Eduardo Batalha.
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Sobre a monografia jurídica

O professor Marchi, ao analisar livros jurídicos sob o ponto de vista da metodologia jurídica, tece certas considerações que divergem da prática a qual estamos acostumados e acreditamos certa. Segundo ele, nos países de grande tradição jurídica, como Alemanha, França e Itália, as publicações do Direito e da Ciência do Direito possuem um estilo próprio que as diferencia e as torna exclusivas.
Ele critica o fato de se utilizar no Brasil as normas da ABNT, próprias da Biblioteconomia, como única maneira de referenciar a bibliografia. Apesar de favorecer uma normatização dos escritos, perde-se a possibilidade de traçar uma identidade com a produção de ciência jurídica dos países citados acima. Neles, as citações são muito diferentes das normas de biblioteca.
Outro ponto criticado é a transposição da linguagem verbal forense para as monografias e livros. Esse costume descaracteriza a tese que se pretende científica, associando-a a petições ou apelações. Por exemplo, a frase que parece comum: “o saudoso mestre baiano, Orlando Gomes”, remete a perguntas como: “você tem mesmo saudades dele? O conhecia bem?”; ou remissões equívocas como “mestre baiano de capoeira?”.
Opções razoáveis ao uso da ABNT e o cuidado com termos que se pretendem exuberantes possibilitam questionamentos e escolhas que podem enriquecer a estilística de uma monografia jurídica.
É o caso, por exemplo, no Brasil, das normas brasileiras (NBR 6023/2002).
Discordamos veementemente dessa opção.
Entendemos ser sempre recomendável, como preceito geral, que o pesquisador procure seguir o método de citação adotado pelos maiores e mais importantes estudiosos de sua disciplina ou, eventualmente, pelas mais importantes revistas científicas de sua área de conhecimento.
E, aliás, a técnica de citação empregada por estes últimos dificilmente costuma coincidir com aquelas da biblioteconomia.
... Há, todavia, fortes razões para crer que a escolha mais apropriada resida no modelo que chamamos de “franco-italiano”. (MARCHI, 2009, p. 163).
MARCHI, Eduardo C. Silveira. Guia de Metodologia Jurídica – 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2009.
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Realidade

A realidade é o campo da atuação do Direito. Ou, pelo menos, naquilo que se pode comprovar sobre essa realidade. Nossos olhos captam de alguma forma a luz e transformam essas informações em cores e formas, porém, nem tudo pode ser explicado pelos sentidos humanos. A Realidade pode ser muito mais complexa, como nos mostram Teoria da Relatividade e a Mecânica Quântica. Como adequar o Direito a essa realidade?
O Livro do Gênesis descreve de maneira poética o momento da Criação do Universo. Embora alguns cientistas ainda discutam se houve realmente um “início”, as evidências mais recentes apontam para o fato de que o Universo em que vivemos teve seu nascimento em algum momento, há cerca de 15 bilhões de anos atrás.
A Natureza muitas vezes não corresponde às nossas intuições ingênuas. No primeiro quarto do século XX o edifício científico construído durante mais de 300 anos por gigantes da Ciência como Galileu Galilei, Isaac Newton, e James Clerk Maxwell, viu as suas bases ruírem diante das ideias revolucionárias de homens como Albert Einstein, Max Planck, Niels Bohr, Louis de Broglie, Wolfgang Pauli, Werner Heisenberg, Erwin Schrödinger, entre outros.
Este conhecimento é o produto de uma revolução científica (talvez a maior da história da humanidade), que ocorreu há menos de 100 anos atrás! As bases desta revolução são duas teorias físicas espetaculares: a Teoria da Relatividade e a Mecânica Quântica. (OLIVEIRA, 2000, p. 2).
OLIVEIRA, Ivan S. Física Moderna para Iniciados, Interessados e Aficionados. São Paulo: Livraria da Física, 2000.
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Dogma da completude, sobre o (II)

A definição de "verdade" é muito complexa. É a separação entre “o mundo das aparências” e “o mundo das ideias”. Aquela, apresentando a mentira, o fugaz, o inconstante; e esta, apresentando a verdade, a essência, o permanente. De Parmênides a Platão (e Cristianismo, entre outros) são várias as correntes de pensamento que se utilizam da dualidade da existência. O “mundo das ideias” (ou o céu) se adéqua à necessidade de haver um parâmetro para o comportamento humano ideal e desejado (tanto para controle social, como para todos os outros tipos de dominação sobre outrem).
Em contrapartida, Nietzsche discorda da existência de uma "verdade filosófica". Diz que é invenção de filósofos que desejam impor os seus valores (e, ao mesmo tempo, valores de certa parcela da população - que pode ser chamada de elite, aristocracia, classe dominante, etc.). Para ele, o único plano de existência verdadeiro é este, o concreto que se pode tocar, sentir, cheirar, sangrar, ouvir; ou seja, o plano que foi denominado de "mundo das aparências".
Com o avanço da Neurociência, podemos até acrescentar a Nietzsche, pois este mundo em que vivemos é a interpretação que nosso cérebro dá às informações recebidas pelos seus sensores (filtradas pelo tato, pela audição, pela visão...). Ele é tão real quanto os nossos sentidos podem captar e o cérebro pode interpretar. Havendo mudanças nesse processo de captar e interpretar, o mundo muda, a realidade se torna outra (como numa paranoia ou num devaneio, por exemplo), ainda assim, completamente (aparentemente) real.
Há ainda, coisas internas às pessoas, como os sentimentos, que produzem efeitos no mundo externo. Pode-se discutir se tais sentimentos não são somente reações bioquímicas no organismo. Porém, os pensamentos, que podem ser influenciados pelas reações químicas, não parecem ser totalmente determinados fisiologicamente. Há coisas num plano invisível e impalpável das quais tomamos conhecimento pelos seus reflexos no mundo exterior - no plano da realidade ou “mundo das aparências”. (Há inúmeras outras “coisas” invisíveis do ponto de vista da física, por exemplo, que influenciam a realidade que vemos – mas não é disso que se trata aqui).
Sendo tão complexa a definição do que é “verdade”, contenta-se com o plano da realidade e dos fatos, do “mundo das aparências”, para definir o que se leva ou não em consideração para o Direito.
O comportamento de uma pessoa pode ser completamente “imoral” na esfera pública e altamente digno na esfera privada, e vice-versa. O pior corrupto pode tentar se passar por um beato perante a sua família. O mais infecto dos seres alega que, “por dentro”, é asséptico. Tal hipocrisia pouco importa ao Direito, pois a “realidade objetiva” e as suas intenções dedutíveis por esta mesma “realidade objetiva” é que classificarão sua conduta.
Mesmo as ações que não estão regradas por lei (em sentido amplo) estão classificadas no ordenamento jurídico. É o art. 5 º, inciso II, da C. F. que representa o “dogma da completude” do sistema jurídico estatista - é a norma geral exclusiva, que exclui da regulamentação todos os demais comportamentos.
“Todos podem fazer o que a lei não proíbe” é a norma pressuposta da regra do inciso II (ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei). Essa definição da norma pressuposta é incompleta (mas necessária), pois num sistema positivista de direito, a regra só é válida se emanada por autoridade competente que está também autorizada a aplicar a sanção. Dessa forma, a norma pressuposta seria mais bem definida por: “todos podem fazer tudo o que a autoridade competente não conseguir coibir, fiscalizar, sancionar (etc.)”.
O dogma da completude, ou seja, o princípio de que o ordenamento jurídico seja completo para fornecer ao juiz uma solução para cada caso sem recorrer à equidade, foi dominante, e em parte o é até hoje, na teoria jurídica continental de origem romanística. É considerado por alguns como um dos aspectos salientes do positivismo jurídico. (BOBBIO, 2008, p. 263).
O raciocínio seguido por esses autores pode ser resumido da seguinte maneira: uma norma que regula um comportamento não só limita a regulamentação e, portanto, as consequências jurídicas que decorrem dessa regulamentação àquele comportamento, mas ao mesmo tempo exclui dessa regulamentação todos os outros comportamentos. […] Todos os comportamentos não compreendidos na norma particular são regulados por uma “norma geral exclusiva”, ou seja, pela regra que exclui (por isso é exclusiva) todos os comportamentos (por isso é geral) que não fazem parte daquele previsto pela norma particular. (BOBBIO, 2008, p. 275).
BOBBIO, Norberto. Teoria geral do direito; tradução Denise agostinetti; revisão da tradução Silvana Cobucci Leite – 2ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 2008.
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Dogma da completude, sobre o (I)

A verdade não depende da mentira, pois o que existe de maneira concreta são as aparências. Porém as aparências não são meras representações ou deformações da verdade, uma vez que o único elemento que se pode observar constatar e avaliar são as ações, independente da existência de uma vontade interna inerente ao sujeito da ação. Essa vontade interna, nada é enquanto permanece interna, ou seja, aquilo que não é ação ou representação não é senão abstração.
Não se trata de mero empirismo, ou da valoração do sensível, pois se é fato que nossos sentidos nos enganam, fato também o é que são estes os elementos primeiros que nos levam a conhecer a realidade. Entenda-se realidade não como aquilo que é verdadeiro, mas sim aquilo que se apresenta como tal, pois o mérito da questão orbita na desconsideração da verdade com forma única, ou de que a racionalidade seja capaz de alcançá-la ou até mesmo desvendá-la como se ela não fosse por si só evidente.
O que me leva a concluir que o que realmente somos não é a soma do que achamos que somos (elemento interno) mais o que as outras pessoas acham que somos (elemento externo), e sim apenas o que parecemos ser é que nos define. Contrário a René Descartes no que cerne à máxima: “penso logo existo”, que trata da existência como uma capacidade subjetiva de se reconhecer, quero dizer que a existência se revela através de uma capacidade cognitiva externa que nos reconheça.
Se o que se é, trata-se do como somos reconhecidos em nossa convivência social, não cabe dividir a atuação humana em esferas de participação social de um indivíduo, elegendo dentre elas uma conduta que seja a verdadeira, uma vez que ambas são expressões da verdade e, portanto, são todas válidas e reais na medida em que se exteriorizam.
Se há mesmo duas morais, uma pública e uma privada, ambas são a verdade do homem, pois aquele que é na vida pública amoral, e o contrário em sua vida privada ou vice-versa, não tem apenas uma verdadeira “natureza” (modo de agir) e sim duas ou mais, sejam quantas forem as esferas sociais das quais este participa. Portanto, o ser é o somatório de todas as verdades expressas pelo reconhecimento social dado ao indivíduo nas esferas em que o mesmo “atua”.
Não é possível para o Direito, como legítima limitação da liberdade individual, abarcar a todas as esferas sociais, o que o confina essencialmente à esfera pública (é certo que seus tentáculos tateiam o seio da vida privada, porém, o controle é feito de maneira bem mais modesta e limitada, haja vista o liberalismo contratual), porém, a vida pública também depende do reconhecimento externo, por exemplo, uma conduta que o direito fixa como criminosa, só terá sua existência na medida em for conhecida e reconhecida pela sociedade, ou pela autoridade competente por zelar pelo interesse social.
Contudo, o subterfúgio constitucional que integra todas as condutas ao ordenamento, e que está posto em nossa carta no segundo parágrafo do artigo 5°: “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”, que em linhas gerais quer dizer: tudo que não é proibido é permitido, não é necessariamente o limite da nossa liberdade de agir, uma vez que somos livres para fazer tudo, desde que não sejamos reconhecidos pela sociedade, pois se não há existência sem o reconhecimento externo, não há como o Direito alcançar a verdade em nossos atos, afinal, eles nunca terão existido.
Leandro Ferri Fabro
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Freud I

Para Michael Kahn, Freud é muito simples: não sabemos a razão de nada, e é tudo muito complicado. É esta a introdução:
Os conceitos básicos da teoria freudiana do inconsciente não são complicados: não sabemos por que sentimos o que sentimos; não sabemos por que tememos o que tememos; não sabemos por que pensamos o que pensamos; e, acima de tudo, não sabemos por que fazemos o que fazemos. O que sentimos, tememos, pensamos e fazemos é muito mais complicado e interessante do que parece à primeira vista. (KAHN, 2007, p. 36).
KAHN, Michael. Freud básico: pensamentos psicanalíticos para o século XXI. Tradução de Luiz Paulo Guanabara. 3ª ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2007.
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Kelsen IV

Teoria da Validade

A obra de Kelsen pode ser considerada um exemplo teoria positivista do direito, se o positivismo jurídico for definido como a doutrina jurídica que defende três ideias fundamentais:
1. Inexistência do direito natural;
2. Todo direito é direito positivo (estabelecido por fatos sociais e atos humanos);
3. A definição do direito pode ser feita sem elementos morais tais como a justiça, o bem comum, o certo e o errado etc.

No entanto, em termos filosóficos não é adequado rotular Kelsen ou qualquer outro jurista como positivista, pois em uma perspectiva filosófica, o que importa é a crítica, ou seja, os aspectos críticos que uma teoria introduz para revelar que outra teoria pode ser discutida, questionada, problematizada.
Na obra de Kelsen esses aspectos críticos aparecem com relação ao realismo jurídico: a teoria pura do direito é uma critica ao movimento realista. Ele discorda da utilização do método empírico como metodologia jurídica.

Kelsen reconhece que o método empírico até pode ajudar a identificar tendências da jurisprudência, porém, esse método não vai além disso, não garante um conhecimento certo e especializado do direito.
A única forma, segundo Kelsen, de obter um conhecimento jurídico certo e autônomo, é a utilização de uma metodologia especificamente jurídica. Essa metodologia decorre da utilização do método analítico já proposto por Austin: a metodologia jurídica aparece quando se realiza uma análise das leis que separam o direito perante outros fenômenos sociais.
É preciso, porém, recuperar o método analítico de um modo radical. Kelsen diz que “é preciso ser mais analítico do que o próprio Austin”, por que a definição do direito como comandos coercitivos do soberano ainda mistura o direito com elementos de outros fenômenos sociais (sociologia, psicologia, política).
A definição de Austin não é uma definição jurídica de direito. Simplesmente separando o direito positivo perante a moral a religião e as ciências naturais não se obtém a essência jurídica de um fenômeno. Essa essência, segundo Kelsen, só aparece quando a separação é completa, ou seja, quando a separação do direito positivo se torna seu isolamento, perante todos os outros fenômenos sociais.

Como fazer com que a separação vire isolamento? A metodologia que tem condições de alcançar esse isolamento do direito positivo é, segundo Kelsen, a metodologia que combina o método analítico com um pressuposto científico que é a separação entre ser e dever ser. Com essa separação é possível distinguir fatos sociais e normas jurídicas, atos criadores de leis e leis jurídicas propriamente ditas. A separação permite ao jurista encontrar o elemento específico que confere existência jurídica para uma obrigação ou um dever, estabelecido por uma norma ou uma lei.

Certamente existe alguma relação entre fatos e normas, atos legislativos e leis jurídicas. As normas e as leis jurídicas são criadas por fatos sociais e atos humanos. No entanto, Kelsen ressalta que é possível separar esses fenômenos: a existência de uma obrigação jurídica não corresponde a um fato social ou a um ato humano; a obrigação não é resultado da existência de comandos coercitivos do soberano; a obrigação não representa a vontade do legislador; a obrigação jurídica tem existência própria que pode ser até mesmo contrária à verdadeira vontade do ente soberano ao criar a norma ou a lei. A existência própria de uma obrigação jurídica é, na visão de Kelsen, sua validade, uma obrigação existe juridicamente quando é válida juridicamente. Uma norma ou uma lei existem de fato quando tem validade perante outra norma ou outra lei. A existência jurídica não se confunde com a efetividade social, ou seja, a existência jurídica não se confunde com a imposição do soberano ou dos tribunais. O conhecimento especificamente jurídico é uma questão de identificação de validade.

(das aulas do professor Carlos Batalha).
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Kelsen III

Com o método empírico, os realistas do direito identificam as manifestações dos tribunais como o verdadeiro direito positivo, o direito se torna algo concreto, um conjunto de fatos observáveis na vida social, no entanto, o método empírico proposto pelos realistas também traz problemas para o conhecimento jurídico.

Entre vários problemas dois se destacam:
1 - O conhecimento jurídico se torna incerto por meio do método empírico. Ou seja, os juristas apenas conseguem identificar o comportamento dos juízes diante de casos passados, e indicar a probabilidade desse comportamento se repetir no futuro. Apontar probabilidades, é não mais poder fazer afirmações do tipo: isso é direito, ou isso não é direito.
2 - A atividade de identificação especializada do direito por meio de advogados, promotores, professores de direito, fica bastante desvalorizada se o método empírico for a melhor forma de conhecer o direito, pois a observação direta dos comportamentos sociais para indicação de probabilidades e tendências é feita com maior exatidão pelos sociólogos.

Se a filosofia realista do direito estiver correta os juristas só alcançam o conhecimento verdadeiro do direito, quando pedem emprestados os métodos das ciências sociais, como se não existisse uma metodologia de estudo própria ao direito,
Esses dois grandes problemas do método empírico estimularam uma reação negativa de muitos juristas diante da filosofia realista do direito. No começo do séc. XX, muitos juristas rejeitaram o realismo jurídico acusando essa perspectiva filosófica do direito de ampliar a incerteza e a desvalorizar os estudos jurídicos. Entre esse juristas críticos do realismo se destacou o jurista austríaco Hans Kelsen, a sua obra traz uma critica a filosofia realista do direito. Kelsen é um anti realista, ou seja, um grande crítico do método empírico.

A teoria de Kelsen não rejeita completamente todos os aspectos do realismo jurídico, ele concorda com os realistas em um aspecto. A crítica a metafísica do direito natural é uma característica comum à teoria de Kelsen e à filosofia realista, todos concordam que o uso de conceitos metafísicos não serve para mostrar o direito de fato existente dentro da vida social.
Kelsen, porém, não aceita o método empírico proposto pelos realistas. Esse método voltado para a observação direta dos comportamentos sociais dos juízes traz uma confusão entre ciência do direito e sociologia jurídica: parece que o direito não é uma ciência autônoma. Kelsen critica a redução do direito aos fatos sociais e a dependência que o realismo estimula perante as outras ciências sociais distintas da ciência jurídica.

Para escapar dos problemas do método realista, Kelsen entende que a melhor saída é utilizar um método de estudo que separe o direito perante os outros fenômenos sociais, com os quais o direito poderia ser confundido. Esse método de separação do direito diante da Moral, diante da Religião, e perante as ciências da natureza, se chama análise, logo, para Kelsen, o melhor método para estudar o direito é o método analítico, que já foi proposto por Austin.
Essa retomada de Austin, porém, precisa ser radical. Segundo Kelsen, é preciso ser mais analítico que o próprio Austin, porque a ideia do direito como comandos coercitivos do soberano, ainda mistura o direito com a sociologia, a psicologia e a política. A verdadeira análise na visão de Kelsen, é a análise radical que isola o direito perante todos os outros fenômenos sociais para garantir ao conhecimento jurídico aquilo que os realistas não garantem, ou seja, certeza e independência nos estudos jurídicos. Assim nasceu a teoria pura do direito.

(das aulas do professor Carlos Batalha).
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Realismo Jurídico

Em princípio, concorda com a ideia de Austin: os conceitos naturais não servem para explicar estudar ou entender o direito. Porém, isso não significa que o realismo seja uma teoria analítica do direito.
O movimento Realista norte americano composto por Oliver Wendell Holmes, John Chipman Gray, Karl Llewelyn, Jerome Frank, o movimento realista americano também elaborou uma critica a metafísica do direito natural, essa critica, porém, não resultou em uma defesa do método analítico como melhor forma de compreender o direito. Eles entendiam que tal método proposto por John Austin tinha tantos problemas quanto a visão jusnaturalista do direito. O problema do método analítico é seu objeto: os conceitos jurídicos, que segundo Austin, poderiam ser encontrados nas leis, porém esses conceitos não passam de palavras dentro da visão realista, são apenas ideias que representam a realidade.

As palavras que representam a realidade não são a própria realidade concreta, portanto a realidade se manifesta em práticas sociais efetivas; ela é constituída de fatos observáveis empiricamente. O único método, portanto, capaz de revelar o direito existente de fato dentro de uma comunidade, só pode ser o método empírico. Quem utiliza o método analítico só conhece o “Law in books”, e não conhece a realidade; para conhecer tal realidade é preciso conhecer o direito na pratica: “Law in Action”.

Para os realistas a prática social efetiva, na qual a realidade do direito poderia ser encontrada, é o processo judicial - dentro de cada processo é possível ver o direito em ação. No processo é possível encontrar obrigações jurídicas concretas quando um determinado juiz impõe um determinado comportamento; obrigações jurídicas de fato existem por meio do comportamento dos juízes, logo, para a visão realista do direito, o conhecimento jurídico verdadeiro é o conhecimento do comportamento dos juízes.

A filosofia realista do direito defende que o direito positivo é o direito manifestado pelos tribunais (jurisprudência). De certa forma, o realismo defende que direito vigente é direito aplicado; é preciso, porém, tomar muito cuidado com a palavra aplicação para se referir ao movimento realista, pois aplicação é uma atividade humana que envolve duas instâncias: o que será aplicado; e depois, o que sofrerá a aplicação. No âmbito jurídico, a aplicação pressupõe a regra que será aplicada e o fato que sofrerá aplicação. Aplicação jurídica é incidência de uma regra sobre um fato concreto. Para os realistas não é isso que os juízes fazem: não há na decisão judicial o encaixe de uma regra prévia e exterior ao processo sobre um fato, surgido após a regra. Os realistas discordam completamente da “jurisprudência mecânica” proposta pela teoria da subsunção: dentro do processo judicial os juízes criam direito. Não faz sentido, portanto, falar em aplicação porque numa visão realista não existem regras. Essa postura é chamada de ceticismo perante as regras. O que existem são apenas imperativos efetivos, imposições concretas que se manifestam quando um juiz impõe um comportamento.

Os realistas reduzem o direito aos fatos sociais nos quais é afirmado um direito. O direito é aquilo que os juízes criam “Judge Made Law”.
A melhor forma de estudar o direito acaba sendo a identificação dos comportamentos sociais nos tribunais, e a indicação da probabilidade desses comportamentos se repetirem no futuro. Conhecer o direito é ser capaz de prever como os juízes se comportarão diante de um determinado caso. A teoria realista é uma teoria da predição jurídica.
A teoria realista por isso se aproxima bastante da sociologia do direito, ambas entendem que:
1- O direito é sua prática social efetiva;
2- O único método pra conhecer o direito de verdade é o método empírico.

Existe, porém, uma diferença sutil entre a teoria realista e a teoria sociológica do direito, que é o foco, ou seja, enquanto a sociologia jurídica estuda os comportamentos sociais nas instituições jurídicas, para melhor compreender a sociedade como um todo, a visão realista do direito estuda os comportamentos sociais dos participantes do processo judicial (especialmente o comportamento dos juízes), para melhor compreender o direito positivo. A teoria realista é uma teoria jurídica, eles queriam conhecer o direito americano.

(das aulas do professor Carlos Batalha).
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